quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Botticelli – A Virgem Maria Despida

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No Nascimento de Venus (1486), ao inverso do quadro Primavera, Botticelli despe a Virgem Maria (ver neste Blog Botticelli – Uma Deusa Vestida).

Vênus foi concebida quando o Titã Cronos castrou o deus Urano e os seus genitais caíram ao oceano, fecundando-o. É a Vênus Anadyomene, aquela que  sai da “espuma clip_image004do mar”. Botticelli apresenta uma deusa desnuda, desembarcando na ilha de Chipre em uma concha aberta, impulsionada pelo deus do vento e sob uma chuva de rosas brancas. O quadro é uma pintura alegórica que justapõe, não só elementos mitológicos gregos e romanos, como também funde a deusa pagã com a Virgem cristã.
A figura da direita representa a ninfa Flora, que personifica a primavera. Em seu movimento, ela se adianta para cobrir a nudez da deusa. Seu vestido e manto, ambos estampados de flores, são mais uma alusão à primavera, estação onde os poderes sensuais de Vênus estão no auge. clip_image007À esquerda está Zéfiro, deus do vento do ocidente, com a esposa raptada – Clóris. No quadro Primavera Botticelli também retrata as duas ninfas, ilustrando um poema de Ovídio, no flagrante onde Zéfiro transforma Clóris em Flora, a deusa das flores.

Assim como ocorreu no quadro Primavera, também aqui não parece haver muita dúvida sobre a intenção do pintor de representar a transfiguração de um sincretismo religioso. Botticelli fora largamente influenciado pela obra do filósofo florentino Marsilio Ticino. Nessa obra, "Ficino tentava mesclar as concepções pagãs e a teologia medieval em uma única doutrina. Por oposição a uma Vênus inferior, terrena, sua Vênus Celeste simbolizava a humanidade, a compaixão, o amor, e sua beleza abria as portas do céu aos mortais" (Rose Marie & Rainer Hagen, 1997).

O casal Hagen vai ainda mais longe. Na Idade Média, atribuíam-se os símbolos tradicionais de Vênus, as rosas, por exemplo, à personagem que dominava o cenário artístico e era o polo oposto, a Virgem Maria. “Acontece o mesmo com a concha. Em relação com a deusa pagã, a concha representava, tal como a água, a fertilidade e ainda, devido à sua semelhança com o sexo feminino, o prazer dos sentidos e a sexualidade”.  “Mas, quando forma uma abóboda sobre a madona do retábulo de São Barnabé clip_image002(à direita, em baixo) simboliza a virgindade”. A ambivalência desse símbolo indica mais um ponto em comum entre as figuras míticas da Antiguidade e da Idade Média.

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Botticelli despe a Virgem, inverte a concha e dá à luz Vênus.

Reparem que Botticelli poderia até mesmo ter usado o mesmo modelo nas duas representações.

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